Por Tania Almeida*

Inspirado na ideia original de Breacking Robert Rules, que tem como autor o mentor do método Construção de Consenso, Larry Susskind, o livro Quando a Maioria não Basta está voltado a lideranças que gerenciam reuniões, grupos e projetos, assim como àqueles que tomam decisões pautadas em um colegiado. Oferece ferramentas para evitar decisões arbitrárias que integram o cotidiano das lideranças, sempre que possível, e decisões pautadas na votação (aqui quebramos a regra de Robert) – quando maiorias são prestigiadas, gerando oposição das minorias.

Lawrence Susskind é o fundador do Consensus Building Institute e atua profissionalmente no ensino e na prática da Construção de Consenso em questões coletivas. É professor do Massachusetts Institute of Technology (MIT), onde coordena o Departamento de Estudos Urbanos e Planejamento de Políticas Ambientais. Ele também dirige a Public Disputes Harvard Law School. Já Jeffrey Cruikshank é editor e autor na área de administração, enquanto Duzert, com pós-doutorado em disputas públicas, é professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV. Juntos atuaram em importantes empresas brasileiras, como a Embraer, e são especialistas em negociação do uso da terra e processos de urbanização.

A Construção de Consenso é instrumento inclusivo e participativo e viabiliza benefícios que são primazes nas situações coletivas: a preservação das diferenças e das discordâncias, a consideração com os interesses de todos, incluindo os das minorias, e a construção do espírito de equipe.

É um procedimento usualmente coordenado por líder(es) que domina(m) a metodologia e as ferramentas de Construção de Consenso e que integram uma equipe de facilitadores em questões coletivas. É importante que essa coordenação também use de criatividade para agregar valor à participação coletiva.

Nessa conversa vou me permitir mesclar ideias dessa obra – que a cada capítulo nos brinda com um quadro-resumo – com outras oriundas da obra original de Susskind. Preciso também confessar minha paixão pelo tema e a tentativa de adotar seus norteadores nas situações do cotidiano – da condução de equipes às tomadas de decisão institucionais.

O que é Consenso

Nessa linha de raciocínio, entende-se por Consenso uma solução com as qual todos os envolvidos possam conviver, obtida pela articulação das ideias de todos sobre determinado tema, que tenha atingido um patamar melhor do que o anteriormente existente.

Por ser instrumento participativo e inclusivo, se alimenta das diferenças e se disponibiliza a harmonizá-las, como se compondo uma colcha de retalhos. Quanto mais distintos os retalhos em cores e padronagens, mais criatividade vão exigir do artesão (no caso, dos facilitadores de diálogos) e maior beleza será conferida ao resultado.

A importância da Mediação

Facilitadores de Construção de Consenso devem pautar sua atuação nos mesmos princípios da Mediação e no conjunto de atitudes que esta preconiza: autonomia da vontade, identificação de posição, interesses e valores, soluções customizadas e de benefício mútuo, vez e voz para todos de forma balanceada, autoria das soluções nas mãos dos participantes, geração de informação como alimento para tomadas de decisão, e ausência de vencedores e de perdedores.

A Mediação como procedimento pode, também, integrar etapas da Construção de Consenso, sempre que uma janela de negociação mais direta ou formal puder desconstruir impasses.

Os passos essenciais da Construção de Consenso

A Construção de Consenso está voltada à resolução de problemas de natureza coletiva, mas pode nortear a cultura de qualquer natureza de convivência que se mantenha continuada no tempo, permear a construção de projetos entre pessoas, instâncias de governos e de governanças, e ser a base de tomadas de decisão colegiadas.

Considerando todos esses cenários, desde a sua origem e em todo o seu trajeto, deve ser inclusiva e colaborativa.

Entrevistas individuais com pessoas ou grupos auxiliarão no mapeamento de todos os envolvidos (importante não deixar de fora atores a favor e contra), na identificação dos interesses iniciais de cada ator e na consequente construção de uma pauta inclusiva:

  • a convocatória para uma reunião conjunta precisa ser concisa e provocar em todos o real interesse por participar; o especial interesse de cada um, previamente identificado, precisa estar ali mencionado ou tangenciado;
  • a coordenação do diálogo precisa ser legitimada por todos e deverá garantir voz e vez a todos; se dará com um único líder ou com uma equipe, que contará com um coordenador;
  • algumas ground rules (regras de convivência) devem ser combinadas ou apresentadas previamente, pois garantirão o primeiro consenso: o diálogo deve fluir;
  • o julgamento e a crítica a pessoas não devem integrar a conversa, tornando a exposição de ideias um lugar seguro de expressão; se necessário, criticamos ideias e não pessoas;
  • convida-se cada ator (ou representante) à exposição, solicitando que utilize a primeira pessoa do singular para se expressar: penso que…, gostaria que…, acredito que…; incentiva-se o protagonismo;
  • não se fala uma segunda vez sem que todos tenham se expressado; para que todos tenham voz, é preciso considerar a existência e a participação do outro como legítima, a partir do cuidado com o próprio tempo de fala;
  • as ideias que integrarão o consenso serão analisadas por todos, que se manifestarão da seguinte forma: me atende plenamente; me atende parcialmente; não me atende, mas posso conviver; não posso conviver com essa ideia. Somente essa última natureza de manifestação motiva a volta de alguma ideia à pauta para receber sugestões, evitando-se o descarte de ideias;
  • o foco da busca de entendimento está nas ideias e sua relevância, não nas pessoas; nos deslocamos dos autores e prestigiamos os seus aportes;
  • um Texto Único deve registrar os consensos, e nele estarão listadas as ideias na proporcionalidade de sua aceitação, sem menção aos autores: a maioria / parte dos / a unanimidade dos presentes propõe…; reforça-se assim a proposta de foco nas ideias, e não em sua autoria;
  • todos devem se encarregar de tarefas resolutivas advindas do consenso. A formação de comitês de acompanhamento e providências, incluindo os atores presentes, auxilia na execução do consenso e em sua corresponsabilização. Um dos seus maiores bens!

 

Onde e quando utilizar o Consenso

Em qualquer coletividade que negocie diferenças, projetos comuns, tomadas de decisão. Classicamente, as políticas públicas e as questões coletivas, como as socioambientais, são cenários de predileção. No entanto, a condução de equipes e de projetos e as decisões colegiadas, como nos Conselhos de Administração ou reuniões de sócios (ou de condomínios de toda sorte), são igualmente cenários que se beneficiam dos ganhos do consenso – todos ouvidos e parcialmente atendidos pelas soluções de benefício mútuo construídas em coautoria. Não é utopia!

 

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Quando a Maioria não Basta – método de negociação coletiva para a construção de consenso, de Lawrence Susskind, Jeffrey Cruikshank e Yann Duzert
Editora FGV, 221 páginas

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* Tania Almeida – Mestre em Mediação de Conflitos e Facilitadora de Diálogos entre pessoas físicas e/ou jurídicas. Há 40 anos desenha e coordena processos de diálogo voltados ao mapeamento, à prevenção de crises, à administração de mudanças e à resolução de conflitos. É idealizadora e fundadora do Sistema MEDIARE, um conjunto de três entidades dedicadas ao diálogo – pesquisas, prestação de serviços, ensino e projetos sociais.