Por Tania Almeida*

Beyond Reason: Using Emotions as You Negatiate
Roger Fisher & Daniel Shapiro

Inspirados no Harvard Negotiation Project (HNP), Roger Fisher, já falecido, negociador renomado e coautor de ´Como Chegar ao Sim´, e Daniel Shapiro, psicólogo dedicado aos aspectos emocionais inerentes a qualquer negociação, e à época da publicação de Beyond Reason, em 2005, diretor associado do HNP, se curvam frente à constatação de que Emotions Matter (emoções são importantes), como anuncia a contracapa do livro. Os autores escrevem juntos essa obra com a intenção de demonstrar: como usar as emoções na transformação de controvérsias – pequenas ou grandes, profissionais ou pessoais – em oportunidade para ganhos mútuos.

O foco é colocado no manejo e endereçamento construtivo de certas emoções, por meio do manejo adequado das preocupações que as originam. Cinco preocupações fundamentais, inerentes ao ser humano e geradoras de fortes reações emocionais, são mencionadas como centrais no desafio de aprimorar relacionamentos e realizar negociações de ganho mútuo em cenários domésticos ou corporativos. A ideia é endereçar as preocupações de origem e não emoções delas resultantesSe fizermos um paralelo com o HNP, seria como focar nos interesses subjacentes às rígidas posições reveladas, e não nas posições.

Emoções positivas ou negativas podem ser obstáculos à negociação, mas também, um grande ativo à mesa, se manejadas adequadamente. Como as primeiras respostas do nosso cérebro e sua bioquímica a qualquer estímulo são involuntárias, sempre precisam ser administradas na vida, não somente à mesa de negociações. O coração acelera, o rosto empalidece e as mãos ficam frias, sem que possamos controlar de prima.

Lidar com emoções é mais difícil do que lidar com as preocupações que as embasam. Portanto, conhecer e endereçar as preocupações que se ocultam sob as emoções, de forma a viabilizar o seu manejo positivo, é a sábia provocação feita por Fisher e Shapiro na publicação Beyond Reason – usando as emoções enquanto se negocia.

 

Quais seriam as 5 preocupações centrais inerentes ao ser humano

Essas preocupações devem ser cuidadas em dupla mão entre os dois negociadores, o que demanda proatividade com relação aos cuidados com o OUTRO (além de consigo mesmo), de forma a viabilizar que também o OUTRO possa respeitar e cuidar das mesmas 5 preocupações com relação a nós.

Seguem as preocupações percebidas pelos autores como centrais:

  • Apreciação: ignorada quando suas ideias, sentimentos e ações são desprezados; praticada quando são legitimados e ganham mérito.

Manejo: o que seria necessário fazer para demonstrar apreciação pelo OUTRO e para ajudá-lo a igualmente apreciar minhas ideias, sentimentos e ações?

  • Pertencimento: comprometido quando se é tratado com distância ou como adversário; prestigiado quando se é tratado com proximidade.

Manejo: como encontrar links com o OUTRO e encurtar distâncias, buscando conexões estruturais e pessoais?

  • Autonomia: desconsiderada quando o outro impõe decisões; considerada quando o outro respeita sua liberdade para tomar decisões.

Manejo: o brainstorming na busca de soluções de benefício mútuo é um importante recurso para expandir a própria autonomia, respeitando igualmente a do OUTRO.

  • Status: não reconhecido quando se é tratado como inferior em relação a outros; prestigiado quando seu mérito como pessoa é reconhecido.

Manejo: nossa autoestima é diretamente alimentada pelo reconhecimento do nosso status. Social skills – cortesia, respeito… – acompanhadas do reconhecimento das competências do OUTRO aproxima os relacionamentos.

  • Papel na relação: desconsiderado quando imposto em conjunto com suas atribuições; reconhecido quando é possível definir o próprio papel na relação e as atribuições a ele pertinentes.

Manejo: cada papel relacional tem seus propósitos e significados; ambos precisam ser co-construídos, compartilhados e respeitados.

 

A importância do manejo das 5 preocupações centrais na Mediação

Os sentimentos positivos ou negativos surgem em resposta à observância ou não dessas 5 preocupações centrais do ser humano. Ou seja, parte da provocação de sentimentos e de seu manejo está em nossas mãos.

Como os autores consideram que esses cuidados devam ser recíprocos em ambientes de negociação lato sensu, na vida social ou laboral, expandem esse entendimento considerando também a atuação de um terceiro facilitador em uma negociação, e a necessidade deste terceiro ter sua atenção voltada para essas preocupações centrais ( o quanto estão, ou não, sendo cuidadas).

Facilitadores de diálogos devem considerar como impasses ao diálogo a não observância dessas 5 preocupações centrais e buscar estratégias para endereçar a sua observância à mesa. O respeito a elas precisa ser oferecido pelo próprio facilitador e estimulado em todos os envolvidos em uma negociação.

Medir a temperatura emocional, o nível de tensão existente e administrar sua elevação quando em níveis ainda manejáveis é atribuição de um facilitador de diálogos. Os recursos para o desempenho dessa tarefa advêm não somente de sua experiência, mas fundamentalmente de sua criatividade frente aos cenários acima descritos.

A atuação de um terceiro facilitador ou mediador é fundamentalmente estratégica e guiada por dois grandes objetivos: fazer o diálogo fluir e desconstruir impasses ao diálogo. O resultado da negociação e o consenso a obter são de responsabilidade e de autoria das partes envolvidas. O fluxo do diálogo é de responsabilidade do facilitador/mediador.

No livro encontramos a orientação prepare…prepare…prepare…, e boas dicas para esse preparo, como as que seguem, oferecidas a negociadores ou a quem vá coordenar processos de diálogo:

  • Propósito (passo 1 do preparo): que goal precisa ser atingido em uma determinada reunião;
  • Produto (passo 2): o que precisa ser gerado na reunião que melhor sirva a esse propósito;
  • Processo (passo 3): como desenhar, estrategicamente, o passo a passo para chegar ao produto que atinge tal propósito – ex. a sequência: identificação de interesses, geração de alternativas e eleição de opções poderia ser um bom desenho estratégico? Reuniões conjuntas e/ou privadas? Em que momento?

 

Como o facilitador, ou o negociador, conclui os cuidados relativos ao preparo

Além de colocar foco nas (i) 5 emoções centrais (e em outras), (ii) no desenho do processo de diálogo e (iii) na substância-objeto da negociação, por recomendação dos nossos autores, o facilitador/negociador deve determinar sua WW e sua DD:

  • WW (What Worked Well) – sempre avaliar e registrar o que funcionou a contento;
  • DD (What Do Differently) – sempre avaliar e registrar o que merece ser revisto das próximas vezes.

Identificar uma boa rotina de preparo – antes, durante e após a negociação – e fazer o registro de acertos e equívocos consolidam aprendizados sobre o que manter, o que aperfeiçoar, o que não repetir (sem esquecer da singularidade de cada caso).

Além disso, e fundamentalmente, estarmos atentos às preocupações que jazem sob as emoções expressas nos auxilia a não sermos conduzidos pelas emoções e a não estarmos desprovidos de estratégias para manejá-las.

Que fique encarnada em nós a especial lição desta leitura: identifique e maneje as preocupações, não as emoções (address the concern, not the emotion)!

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Beyond Reason – using emotions as you negotiate.
Roger Fisher & Daniel Shapiro
236 páginas

 

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* Tania Almeida – Mestre em Mediação de Conflitos e Facilitadora de Diálogos entre pessoas físicas e/ou jurídicas. Há 41 anos desenha e coordena processos de diálogo voltados ao mapeamento, à prevenção de crises, à administração de mudanças e à resolução de conflitos. É idealizadora e fundadora do Sistema MEDIARE, um conjunto de três entidades dedicadas ao diálogo – pesquisas, prestação de serviços, ensino e projetos sociais.